Julgamento de Lutero

Lutero enviou uma cópia das teses, juntamente com uma carta muito respeitosa, ao tal arcebispo Alberto de Brandeburgo. Este, sentindo-se prejudicado, enviou o correio para Roma, ao papa Leão X, com o pedido de intervenção. O imperador Maximiliano também ficou irado com as atitudes de Lutero e pediu a intervenção do papa. Este, por sua vez, enviou a questão à congregação dos agostinhos em Heidelberg e Lutero foi convocado a comparecer perante o principal da Ordem. Temendo por sua vida, dirigiu-se para lá e qual não foi o seu espanto quando soube que muitos dos monges eram favoráveis à sua doutrina. Lutero regressou a Wittenberg fortalecido com o apoio da sua Ordem.

O papa tomou então outra decisão. Comissionou o cardeal Caetano, da ordem domi­nicana, que era o legado papal à dieta (assembleia) do império, para entrevistar Lute­ro e o obrigar a retractar-se sob pena de ser levado prisioneiro a Roma. Mesmo saben­do que João Huss, na Boémia, havia sido queimado em violação dum salvo-conduto, em 1415, o príncipe Frederico pediu ao imperador Maximiliano um salvo-conduto para Lutero comparecer perante o cardeal em segurança. Um ano após da afixação das teses, em Outubro de 1518, Lutero apresentou-se na dieta para responder por sua heresia. Essa entrevista não resultou porque o cardeal só intimava Lutero a retractar-se sem poder convencê-lo, pela Bíblia, do seu suposto erro. Perante a insistência do cardeal: “Retractas-te ou não?” Lutero respondia: “Não posso nem quero retractar-me de coisa alguma, pois ir contra a consciência não é justo nem seguro. Deus me ajude. Amén”.

Lutero encontrou apoio na sua Universidade e no soberano príncipe Frederico, o Sá­bio. No princípio o eleitor defendeu Lutero mais por questões de justiça do que pelas suas ideias; mas posteriormente foi convencido que o monge tinha razão. Além disso, ele não apreciava que os italianos se metessem nos assuntos dos alemães. Era o nacio­nalismo em despertamento.

Lutero encontrou, também, em Filipe Melanchton, um aliado valioso. Tinha ele 21 anos quando chegou a Wittenberg, em 1518, para ensinar grego na Universidade. Co­nhecedor das línguas clássicas e do hebraico, tornou-se o teólogo da Reforma, defen­dendo lealmente, com outros, as opiniões de Lutero. Todos eles reconheceram a Bí­blia como a única autoridade em matéria de teologia, fé e moral.

O erudito Filipe Melanchton, companheiro de Lutero durante 30 anos, foi o autor do primeiro tratado teológico da Reforma, que saiu em 1521. Atingiu inúmeras edições durante a sua vida e fez dele o teólogo do Movimento Luterano.

Durante os primeiros meses de 1519 Lutero dedicou-se a estudar a história dos papas e encontrou bases para justificar a sua dúvida sobre a autoridade papal. O estudo da Bíblia convencera‑o da justificação pela fé. O estudo do papado convenceu‑o de que o papa não tinha recebido o direito de ser a cabeça de todas as igrejas.

Posteriormente, Lutero foi convencido para uma discussão pública com o brilhante orador e teólogo conservador John Eck, em Leipzig, no mês de Julho de 1519. Eck, com a sua argúcia, conseguiu levar Lutero a admitir a falibilidade de um concílio ge­ral e a confessar a sua relutância em aceitar as decisões papais sem as questionar, as­sim como a admitir que “entre as crenças condenadas de John Huss e seus discípulos existem muitas que são verdadeiramente cristãs e evangélicas e que a Igreja Católica não pode condenar”. Esta parcial identificação com as doutrinas hussitas alegrou Eck com uma possível vitória sobre Lutero. Seria o princípio do fim para ele. Mais tarde, em Fevereiro de 1520, escreveu ironicamente num dos seus panfletos: “Somos todos hussitas sem o saber. São Paulo e Santo Agostinho são hussitas”.

Em 1520, Lutero resolveu publicar três panfletos a fim de levar o assunto ao conheci­mento do povo alemão. Em “Apelo à Nobreza germânica” atingira a hierarquia roma­na, demolindo, à luz das Escrituras, os argumentos papais de que a autoridade espiri­tual era superior à temporal, de que somente o papa poderia interpretar as Escrituras, e que somente ele poderia convocar um concílio. Para Lutero, os príncipes poderiam, caso fosse necessário, reformar a Igreja, o papa não deveria interferir nos assuntos ci­vis, e os crentes tinham o direito de eleger os seus sacerdotes. Em “O Cativeiro Babi­lónico” desafiou o sistema sacramental romanista limitando a três os sacramentos vá­lidos, Baptismo, Santa Ceia e Penitência, ou confissão privada. No terceiro panfleto, “Sobre a liberdade do Homem Cristão” atingiu a teologia romana ao reconhecer o sa­cerdócio de todos os cristãos como resultado da sua fé em Cristo.

Após longas controvérsias sobre os ensinamentos e publicações, Lutero foi, finalmen­te, excomungado por bula do papa Leão X, em Junho de 1520. Entretanto, as suas pu­blicações alimentaram as chamas duma fogueira em Colónia. A dita bula foi recebida como um desafio e classificada como “bula execrável do anticristo”. Como resposta, aos 10 de Dezembro, perante uma assistência de professores, estudantes e povo, Lute­ro queimou a bula juntamente com cópias do Direito Canónico e outros decretos pa­pais. Este acto marcava a renúncia definitiva de Lutero à Igreja Romana.

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